Sobre o livro Entre a estatueta do Oscar e o Oscar da estatueta
ISBN 85-88959-06-2
dimensão: 18 x 18 cm
páginas: 202
brochura
2004
Sobre a coleção Recém-Mestre
A
proposta da Coleção Recém-Mestre é publicar
as dissertações que obtiveram nota máxima e
indicação de publicação pela Banca de
Defesa. O
projeto visa integrar o recém-mestre ao cenário
acadêmico e profissional, motivando a continuidade dos estudos e
considerando o mestrado como uma etapa dedicada à pesquisa
científica que provoca uma reflexão capaz de motivar o
pensamento crítico. A publicação das
dissertações tem por objetivo a valorização
e validação dos trabalhos dos membros da Banca e
é, ao mesmo tempo, um incentivo ao aluno e uma
contribuição à comunidade acadêmica.
Entendendo que a integração instituição de
ensino-sociedade é de extrema relevância, o Mestrado em
Comunicação e Linguagens, ao publicar suas melhores
dissertações, quer oportunizar a
disseminação do conhecimento, oferecendo ao
público temas de interesse na área de
comunicação social e de interfaces midiáticas. A
Universidade Tuiuti do Paraná (UTP), através de seu Setor
de Pós-Graduação e Editoração,
compreendeu e viabilizou esta publicação.
“Entre a estatueta do Oscar e o Oscar da estatueta”, de Tom
Lisboa, é o primeiro volume publicado por esta
coleção idealizada pela Profª Drª. Denize
Correa Araujo.
Trechos do livro
Resumo
O
objetivo desta pesquisa, Entre a estatueta do Oscar e o Oscar da
estatueta, é traçar uma linha evolutiva da imagem do
Oscar desde sua fase ornamental até a constituição de seu próprio
simulacro. Neste percurso, se pretende também identificar a formação
do imaginário que circunda a estatueta, estudar a importância dos
meios de comunicação de massa na transformação da estatueta em seu
próprio simulacro e analisar o caráter espetacular da cerimônia do
Oscar em consonância com os tempos atuais. O referencial teórico
condutor é a teoria das quatro fases sucessivas da imagem proposta
por Jean Baudrillard, teoria essa que permeia a trajetória proposta
por este estudo. Também servirão de referência, para fundamentar
este estudo e dialogar com as idéias propostas por Baudrillard, as teorias de cultura de massa e imaginário de Edgar Morin, as
reflexões de Guy Debord sobre a sociedade do espetáculo e os
conceitos de Marshall McLuhan a respeito dos meios de comunicação. O
objeto de pesquisa escolhido
se insere no campo específico do Mestrado de Comunicação e
Linguagens por se tratar de estudo sobre um ícone da comunicação de
massa, um objeto que sintetiza o poder e o papel da mídia e de suas
interfaces com a indústria cinematográfica. Como interesse acadêmico, o estudo procura colaborar
na construção de referências teóricas acerca do tema e estimular o
aprofundamento de pesquisas sobre o Oscar, um dos principais símbolos
da cultura de massa, que mesmo após 75 anos de existência, ainda é
submetido a um tipo de literatura que aborda apenas aspectos
sensacionalistas ou curiosidades de bastidores.
A
"transformação" da imagem da estatueta do Oscar se
dá através de quatro fases, seguindo uma proposta de Jean
Baudrillard. Veja os trechos a seguir:
Referente à primeira fase da imagem, proposta por Jean
Baudrillard:
“De qualquer forma, a
estatueta ainda não é um símbolo composto por um sistema de valores
próprios e, por isso, é incapaz de mobilizar o imaginário coletivo
para despertar emoções ou direcionar um pensamento. Mesmo após o início
da premiação, em 16 de maio de 1929, a importância deste prêmio
ainda permaneceu obscura até o começo da década de trinta. Em
primeiro lugar porque o rádio e a imprensa ainda não divulgavam maciçamente
a cerimônia e, em segundo, porque uma sintonia cultural ainda não
havia sido estabelecida. Uma declaração de Cary Grant torna esta última
afirmação mais clara: “Havia algo de embaraçoso nesta reunião de
pessoas bem-sucedidas se auto-congratulando. Quando tudo começou, nós
até brincávamos: ‘Está bem, Freddie March, nós sabemos que você
ganha um milhão de dólares por filme. Agora suba lá e pegue sua
medalhinha’”.
Demorou
alguns anos para que esta situação se revertesse em favor da
estatueta. No entanto, por pertencer a uma indústria que celebra a
estrela e o gênero, ela teve a oportunidade de construir sua imagem
em cima de estereótipos bem-sucedidos que remetem ao sucesso, poder e
individualidade. Assim, gradualmente, ela vai deixando de ser apenas o
reflexo de uma realidade profunda para finalmente fabricar uma nova
identidade.”
Referente
à segunda fase da imagem:
“As
estrelas de cinema, ao receberem o prêmio da Academia, aceitam
involuntariamente a concessão de um valor simbólico à estatueta. São
esses heróis do consumo que ao possuírem este objeto vão
transformar, aos olhos do público, o Oscar em um produto desejável,
posicionado muito além de seu valor de uso. Primeiro pela identificação
com que o ganhou e, em segundo, porque este é um produto raro, não
disponível para venda.
Um
pouco do que Holden chamou de “Febre do Oscar” advém desta
escassez do produto e da visibilidade de quem o ganhou. As próprias
estrelas não ficaram indiferentes à sedução alcançada pelo
objeto. Emanuel Levy cita, em The
Winner is..., vários casos de atores e atrizes que nesta época
faziam campanhas caras (mas, discretas se comparadas com as que são
feitas atualmente) para consegui-lo. Dentre as várias declarações,
duas demonstram bem esta transição do Oscar de objeto decorativo
para objeto de desejo:
Humphrey
Bogart, em 1951, depois de ganhar o Oscar de melhor ator por Uma
Aventura na África (1951): “A forma de sobreviver ao Oscar é
nunca tentar receber outro. Você viu o que acontece com alguns
ganhadores do Oscar. Eles passam o resto de suas vidas rejeitando
roteiros, enquanto buscam o papel para ganhar outro Oscar. Diabos,
espero nunca mais ser indicado. De agora em diante, quero papéis
triviais” (...) Mercedes McCambridge, em 1949, ao ganhar o Oscar de
melhor atriz coadjuvante por A
Grande Ilusão(1949): “O Oscar pertence a mim ou eu pertenço a
ele? Qual de nós dois estaria sempre em débito um com o outro?”
(in LEVY 1990:305)
O
Oscar converte-se também em celebridade. Assim como a estrela, poucos
tem contato direto com ele. Sua relação com o público é sempre
mediada através de imagens reproduzidas nas mais variadas mídias.
Ele torna-se um material importante na divulgação dos filmes e, até
mesmo faz referência àquelas “pessoas admiráveis em que o sistema
se personifica [e que] são conhecidas por aquilo que não são”(DEBORD
1997:41).”
Referente
à terceira fase da imagem:
“A
partir de 1950, a publicidade chega definitivamente à indústria do
cinema para multiplicar as mediações comunicacionais entre a produção
cinematográfica hollywoodiana e seu público cada vez mais exíguo. O
discurso publicitário vai retrabalhar, nos espectadores, estímulos
emocionais semelhantes aos processos de projeção-identificação já
bem desenvolvidos na década anterior. Vimos, inclusive, no item O
herói simpático, que a platéia desejava que o herói da tela
fosse protegido na segurança do happy
end. A diferença é que este discurso publicitário não vai
estar embutido na narrativa fílmica, mas agregado na forma de uma
dramatização especialmente desenvolvida para despertar as mais
variadas sensações no público antes mesmo dele conferir o filme
pessoalmente. A emoção e a curiosidade pára-textuais surgem como
novos artifícios a serem utilizados pela publicidade na busca do
desenvolvimento de um novo reflexo involuntário que levasse a
sociedade de volta ao cinema.
Em
1953, época da primeira transmissão ao vivo pela televisão, o Oscar
já fazia parte da cultura norte-americana há 25 anos e representava
um modelo de simulação que Baudrillard denominou de “síntese do
artificial” (1974:135-6). Muito utilizado em publicidade, a “síntese
do artificial” consiste da utilização do discurso tautológico
para exprimir uma realidade. No caso, a Academia instituiu “Oscar,
‘a excelência cinematográfica’”. “Tudo nele é metáfora
(...) a repetição é que origina em toda a parte a causalidade
eficaz” (1974:135). Baudrillard ainda argumenta que “estes
sintagmas publicitários não proporcionam qualquer sentido, não são
verdadeiros nem falsos – mas eliminam precisamente o sentido e a
prova. (...) O consumidor consagrará apenas o acontecimento”
(1974:136).”
Referente
à quarta fase da imagem:
“Após
o televisionamento da cerimônia do Oscar, as motivações que
justificavam a busca pela estatueta estavam consolidadas porque também
o público havia desenvolvido a habilidade de, inconscientemente,
decodificar estas convenções criadas pela Academia. De
acordo com Baudrillard, é a profusão publicitária que põe fim à
fragilidade do objeto porque “qualquer objeto será considerado mau
enquanto não resolver esta culpabilidade de não saber o que quero ou
o que sou” (2002:180). Assim como dentro de um gênero de
fantasia ou ficção não questionamos o fato de que um homem possa
voar, esta busca por reconhecimento através de um objeto e a
descomunal exaltação desta conquista só se tornam verossímeis aos
olhos de quem aceitou deliberadamente o condicionamento para isto.
Baudrillard destaca este poder condicionante que a comunicação de
massa tem em criar a “lógica da fábula e da adesão. Não
acreditamos nela e todavia a mantemos. (...) O indivíduo é sensível
à temática latente de proteção e de gratificação”
(2002:175-6).”
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