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Sobre o livro

Resumo

O objetivo desta pesquisa, Entre a estatueta do Oscar e o Oscar da estatueta, é traçar uma linha evolutiva da imagem da estatueta do Oscar desde sua fase ornamental até a constituição de seu próprio simulacro. Neste percurso, se pretende também identificar a formação do imaginário que circunda a estatueta, estudar a importância dos meios de comunicação de massa na constituição de seu próprio simulacro e analisar o caráter espetacular da cerimônia do Oscar em consonância com os tempos atuais. O referencial teórico condutor é a teoria das quatro fases sucessivas da imagem proposta por Jean Baudrillard, teoria essa que permeia a trajetória proposta por este estudo. Também servirão de referência, para fundamentar este estudo e dialogar com as idéias propostas por Baudrillard, as  teorias de cultura de massa e imaginário de Edgar Morin, as reflexões de Guy Debord sobre a sociedade do espetáculo e os conceitos de Marshall McLuhan a respeito dos meios de comunicação. Como interesse acadêmico, o estudo procura colaborar na construção de referências teóricas acerca do tema e estimular o aprofundamento de pesquisas sobre o Oscar, um dos principais símbolos da cultura de massa, que mesmo após 88 anos de existência, ainda é submetido a um tipo de literatura que aborda apenas aspectos sensacionalistas ou curiosidades de bastidores.




O Oscar da estatueta se refere ao momento em que a estatueta do Oscar transcende o prórpio
cinema e passa ser usada como padrão de excelência até mesmo para laticínios ou educação.


Trechos para leitura


A "transformação" da imagem da estatueta do Oscar se dá através de quatro fases, seguindo uma proposta de Jean Baudrillard. Veja os trechos a seguir:

 

Referente à primeira fase da imagem, proposta por Jean Baudrillard:

“De qualquer forma, a estatueta ainda não é um símbolo composto por um sistema de valores próprios e, por isso, é incapaz de mobilizar o imaginário coletivo para despertar emoções ou direcionar um pensamento. Mesmo após o início da premiação, em 16 de maio de 1929, a importância deste prêmio ainda permaneceu obscura até o começo da década de trinta. Em primeiro lugar porque o rádio e a imprensa ainda não divulgavam maciçamente a cerimônia e, em segundo, porque uma sintonia cultural ainda não havia sido estabelecida. Uma declaração de Cary Grant torna esta última afirmação mais clara: “Havia algo de embaraçoso nesta reunião de pessoas bem-sucedidas se auto-congratulando. Quando tudo começou, nós até brincávamos: ‘Está bem, Freddie March, nós sabemos que você ganha um milhão de dólares por filme. Agora suba lá e pegue sua medalhinha’”.

Demorou alguns anos para que esta situação se revertesse em favor da estatueta. No entanto, por pertencer a uma indústria que celebra a estrela e o gênero, ela teve a oportunidade de construir sua imagem em cima de estereótipos bem-sucedidos que remetem ao sucesso, poder e individualidade. Assim, gradualmente, ela vai deixando de ser apenas o reflexo de uma realidade profunda para finalmente fabricar uma nova identidade.”

Referente à segunda fase da imagem:

“As estrelas de cinema, ao receberem o prêmio da Academia, aceitam involuntariamente a concessão de um valor simbólico à estatueta. São esses heróis do consumo que ao possuírem este objeto vão transformar, aos olhos do público, o Oscar em um produto desejável, posicionado muito além de seu valor de uso. Primeiro pela identificação com que o ganhou e, em segundo, porque este é um produto raro, não disponível para venda.  

Um pouco do que Holden chamou de “Febre do Oscar” advém desta escassez do produto e da visibilidade de quem o ganhou. As próprias estrelas não ficaram indiferentes à sedução alcançada pelo objeto. Emanuel Levy cita, em The Winner is..., vários casos de atores e atrizes que nesta época faziam campanhas caras (mas, discretas se comparadas com as que são feitas atualmente) para consegui-lo. Dentre as várias declarações, duas demonstram bem esta transição do Oscar de objeto decorativo para objeto de desejo:

 

Humphrey Bogart, em 1951, depois de ganhar o Oscar de melhor ator por Uma Aventura na África (1951): “A forma de sobreviver ao Oscar é nunca tentar receber outro. Você viu o que acontece com alguns ganhadores do Oscar. Eles passam o resto de suas vidas rejeitando roteiros, enquanto buscam o papel para ganhar outro Oscar. Diabos, espero nunca mais ser indicado. De agora em diante, quero papéis triviais” (...) Mercedes McCambridge, em 1949, ao ganhar o Oscar de melhor atriz coadjuvante porA Grande Ilusão(1949): “O Oscar pertence a mim ou eu pertenço a ele? Qual de nós dois estaria sempre em débito um com o outro?” (in LEVY 1990:305)

O Oscar converte-se também em celebridade. Assim como a estrela, poucos tem contato direto com ele. Sua relação com o público é sempre mediada através de imagens reproduzidas nas mais variadas mídias. Ele torna-se um material importante na divulgação dos filmes e, até mesmo faz referência àquelas “pessoas admiráveis em que o sistema se personifica [e que] são conhecidas por aquilo que não são”(DEBORD 1997:41).”

Referente à terceira fase da imagem:

“A partir de 1950, a publicidade chega definitivamente à indústria do cinema para multiplicar as mediações comunicacionais entre a produção cinematográfica hollywoodiana e seu público cada vez mais exíguo. O discurso publicitário vai retrabalhar, nos espectadores, estímulos emocionais semelhantes aos processos de projeção-identificação já bem desenvolvidos na década anterior. Vimos, inclusive, no item O herói simpático, que a platéia desejava que o herói da tela fosse protegido na segurança do happy end. A diferença é que este discurso publicitário não vai estar embutido na narrativa fílmica, mas agregado na forma de uma dramatização especialmente desenvolvida para despertar as mais variadas sensações no público antes mesmo dele conferir o filme pessoalmente. A emoção e a curiosidade pára-textuais surgem como novos artifícios a serem utilizados pela publicidade na busca do desenvolvimento de um novo reflexo involuntário que levasse a sociedade de volta ao cinema.

Em 1953, época da primeira transmissão ao vivo pela televisão, o Oscar já fazia parte da cultura norte-americana há 25 anos e representava um modelo de simulação que Baudrillard denominou de “síntese do artificial” (1974:135-6). Muito utilizado em publicidade, a “síntese do artificial” consiste da utilização do discurso tautológico para exprimir uma realidade. No caso, a Academia instituiu “Oscar, ‘a excelência cinematográfica’”. “Tudo nele é metáfora (...) a repetição é que origina em toda a parte a causalidade eficaz” (1974:135). Baudrillard ainda argumenta que “estes sintagmas publicitários não proporcionam qualquer sentido, não são verdadeiros nem falsos – mas eliminam precisamente o sentido e a prova. (...) O consumidor consagrará apenas o acontecimento” (1974:136).”

Referente à quarta fase da imagem:

“Após o televisionamento da cerimônia do Oscar, as motivações que justificavam a busca pela estatueta estavam consolidadas porque também o público havia desenvolvido a habilidade de, inconscientemente, decodificar estas convenções criadas pela Academia. De acordo com Baudrillard, é a profusão publicitária que põe fim à fragilidade do objeto porque “qualquer objeto será considerado mau enquanto não resolver esta culpabilidade de não saber o que quero ou o que sou” (2002:180). Assim como dentro de um gênero de fantasia ou ficção não questionamos o fato de que um homem possa voar, esta busca por reconhecimento através de um objeto e a descomunal exaltação desta conquista só se tornam verossímeis aos olhos de quem aceitou deliberadamente o condicionamento para isto. Baudrillard destaca este poder condicionante que a comunicação de massa tem em criar a “lógica da fábula e da adesão. Não acreditamos nela e todavia a mantemos. (...) O indivíduo é sensível à temática latente de proteção e de gratificação” (2002:175-6).”


Outros Textos

:. O Oscar e a "história da excelência" da arte cinematográfica (publicado no jornal correio do povo, em 13/02/2016)

:. SHOW DE CALOUROS: nova temporada no Oscar e Globo de Ouro (janeiro/2011)

:. Release para o lançamento  do livro no Festival de Gramado 2004