A desilusão com os políticos é tão
avassaladora que a maioria dos brasileiros, para não dizer a
totalidade, simplesmente ignora a existência do Congresso
Nacional. E com isso acaba se esquecendo que lá também existem
e ocorrem coisas boas e importantes. Agráfica do Senado é um
exemplo. E vamos ficar por aí.
Com trabalhos de alta qualidade, ela tem resgatado e publicado
obras de grande valor. Agora, está nos brindando com uma jóia:
o álbum de luxo As Aventuras de Nhô-Quim & Zé Caipora, de
Angelo Agostini.
A pesquisa, organização e introdução é de Athos Eichler
Cardoso. O trabalho sobre os primeiros quadrinhos brasileiros
abrange o período de 1869 a 1883. As imagens foram
digitalizadas diretamente dos originais das revistas Vida
Fluminense, O Malho e Don Quixote.
Jornalista mais popular do século 19, Ângelo Agostini
destacou-se, como ressalta a mensagem do editor, pelo desenho,
pela ilustração, pela pintura e pelas caricaturas do regime
escravagista, não poupando nem o próprio imperador. Ou seja,
diante de tanta sabujice como se vê hoje em dia, era
jornalistas dos bons: descia a ronca mesmo nos poderosos de
plantão.
Em litografia, Agostini desenhou as duas histórias em
quadrinhos apontadas como as primeiras de longa duração
publicadas no Brasil, listadas, também, entre as pioneiras do
âmbito mundial.
De fato. A respeito, o jornalista Sérgio Augusto, no Estadão
do dia 22 de junho deste ano, lembra que, "para os
puristas, narrativa ilustrada sem balões é pré ou proto-história
em quadrinhos, não mais do que isso. Se tivessem balões, as
aventuras (ou desventuras) de Nhô-Quim teriam antecipado de
quase 30 anos a indiscutível matriz do gênero, o Menino
Amarelo, do americano Richard F. Outcault, e consagrado Agostini
como o inventor do gibi".
Nascido em Vercelli, Piemont, Itália, em 1843, Agostini
desembarcou, gostou e se tornou brasileiro em 1888, já pegando
briga a favor dos abolicionistas. Tinha 16 anos. Passou a infância
e adolescência em Paris, onde aprendeu a desenhar na Escola de
Belas Artes. Esteve em São Paulo e foi para o Rio, em 1867,
onde criou jornais e iniciou a carreira de caricaturista e
editor na Vida Fluminense, que ainda se chamava O Arlequim.
Dirigiu na mesma época O Mosquito. Seu maior feito editorial,
no entanto, como destaca Sérgio Augusto, foi a fundação da
Revista Ilustrada, em 1876, "que durante 12 anos comandou
galhardamente, submetendo todos os grandes acontecimentos políticos
e sociais do período ao seu imenso talento".
E por aí foi. Colaborou com Tico-Tico, a primeira publicação
infantil brasileira, lançada pela revista O Malho. O desenho do
título - logotipo – é de sua autoria. Sérgio Augusto
ressalta ainda que a Índia Inaia, a primeira heroína dos gibis
brasileiros, tinha sangue tupi-guarani.
A álbum Nhô-Quim e Zé Caipora (caipora significa
originalmente azarento) é um tesouro não apenas para quem
gosta e/ou estuda gibi, mas também para quem adora mergulhar na
história – não oficial – do país. Nesse ponto, a imprensa
é a ferramenta mais adequada. Ou já foi. Naquele tempo era,
com certeza, e graças a profissionais da cepa deste italiano
simplesmente genial.
Ah, o álbum custa R$ 50. Uma pechincha pela sua importância.
Serviço: As Aventuras de Nhô-Quim e Zé Caipora, 188 páginas,
edição de luxo.
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Gazeta do Povo - 23/09/02 - Francisco
Camargo - CadernoG
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