O
Aparecimento do Som - Parte 4
Os microfones eram tão sensíveis
que os técnicos tinham que tirar seus sapatos para entrar no
estúdio. Até o girar do filme da câmera era reproduzido. Ela
acabou sendo confinada em uma caixa à prova de som e ficando
ali parada. Por isso a maioria as cenas de diálogo eram
filmadas em close-up, e nunca existiam mais de três ou quatro
pessoas em cena. Os microfones também eram tão estáticos
quanto as câmeras e não havia espaço suficiente ao redor
deles para mais de dois atores.
Fora a interferência da câmera, outros barulhos tinham que ser
eliminados e vários métodos foram utilizados. Joseph L.
Mankiewicz lembra que a maioria dos filmes era feita a noite.
Eles começavam a filmar às 5 da tarde e iam até as 3 da manhã,
porque desta forma eles evitariam o barulho do tráfego na
Melrose Avenue.
Willian Clothier que trabalhou como assistente de câmera tem
memórias não muito agradáveis deste tempo: “A caixa que
abrigava a câmera não era uma caixa qualquer. Ela era enorme e
comportava uma mesa, duas câmeras, e quatro pessoas lá dentro.
Com as luzes do estúdio ligadas, e principalmente no verão,
aquilo virava o próprio inferno”.
Surgia então uma nova autoridade: o homem do som. Como ninguém
entendia o que ele fazia, ficavam todos em suas mãos. Ele era
uma pessoa para ser respeitada e temida. Esther Ralston lembra
que quando estava filmando The Wheel of Life com Richard Dix, em
1929, Dix apontou para o responsável pelo som e disse para ela:
“Vê aquele cara ali? Seja boazinha com ele ou ele vai fazer
de você um barítono e de mim uma soprano.”
O som mudou tudo, inclusive a atmosfera no set de filmagem. No
tempo dos filmes mudos podia-se andar tranqüilamente pelo set,
mesmo quando estavam filmando, pessoas podiam rir e conversar e
atores como Fritz Feld tinham a sua disposição um quarteto de
violinos, piano e cello tocando La Marseillaise para fazê-lo
chorar. Com som o esquema era outro: sem música, visitantes e
portas fechadas. Era um tempo em que se usava muita luz, iluminação
para quatro ou cinco câmeras ao mesmo tempo. Era necessário
vedar todas as portas e ventiladores não eram permitidos por
causa do barulho. Depois de cada cena eles paravam tudo e
deixavam as pessoas se refrescarem um pouco.
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O Aparecimento do
Som - Parte 5
Nos tempos do cinema mudo,
William Clothier trabalhava em um pequeno estúdio em Poverty
Row. Neste local foram filmados a maioria dos westerns da época,
e seus custos eram tão baixos, que chamá-los de baixo orçamento
lhes dá uma dignidade que certamente eles não merecem. De manhã
ele chegava ao estúdio, pegava sua pick up, colocava o
equipamento no banco de trás, parava em Hollywood para pegar
alguns cowboys, parava de novo para comprar um lanche para a
equipe (a 25 centavos de dólar cada um) e ia para o local das
filmagens, que ficava a uns 15 quilômetros fora da cidades.
“Nós tínhamos oito, dez pessoas na equipe inteira, contando
os atores. Claro que nós também tínhamos os cavalos, mas eles
eram emprestados de fazendeiros locais. Depois que o som
apareceu, meu Deus, nós deixávamos o estúdio com quinze
caminhões, carros, e ônibus, e com certeza tínhamos mais
motoristas do que as pessoas que usávamos nas produções
antigas. O orçamento aumentou muito também. Eu lembro de fazer
filmes de faroeste em seis dias ao custo de US$ 3.000 ou US$
4.000, incluindo o pagamento dos atores. Depois do som, este
valor passou para US$ 500.000.”
Como já foi dito anteriormente, câmeras e microfones estáticos
geravam filmes estáticos, e foi assim até 1929. O responsável
pela “liberação” da câmera foi Rouben Mamoulian, um
diretor de teatro americano de grande reputação na Broadway na
década de 20, que foi contratado pela Paramount para dirigir o
melodrama Applause, com Helen Morgan. Mesmo nunca tendo dirigido
um filme antes, ele deu um passo importante na história dos
filmes falados.
Apesar do público vir aumentado consideravelmente desde o
aparecimento do som, ele já estava apresentando sinais de cansaço
com a monotonia, lentidão e a natureza teatral destes filmes. A
maioria deles eram adaptados diretamente do teatro, e ficaram
conhecidos como “Teacups Dramas” devido ao fato de ninguém
neles parecer fazer mais do falar e beber chá. Como Mamoulian
disse: “Os estúdios queriam diálogos. Então eles compravam
uma peça, a mantinham do jeito que estava e a filmavam com três
câmeras. O resultado era uma peça de teatro filmada.”
Devido a sua total falta de experiência em fazer filmes, ele
decidiu passar um tempo no Astoria Studios, em Nova York,
estudando os métodos de outros diretores antes de começar seu
prórprio filme. Ele observou, fez perguntas, aprendeu o que
fazer, e principalmente, o que não fazer. Sua primeira sugestão
ao começar as filmagens foi tentar mover os bangalôs em que as
câmeras ficavam confinadas.
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O Aparecimento do Som - Parte 6
Todos disseram que era impossível,
que o bangalô era muito pesado para ser movido e que era mais fácil
deixar duas câmeras filmando (uma em close-up e outra de
longe). Resistências vencidas, o diretor chega a seu primeiro
dia de filmangem. A primeira pergunta do cameraman George Folsey
foi onde ele deveria por as câmeras. Para seu espanto,
Mamoulian disse que haveria apenas uma câmera. O que ele queria
era que tudo fosse feito em uma tomada, começando a filmar de
longe e terminando em um close-up. Colocando em outras palavras,
como Folsey afirmou, ele queria o impossível, que era mover
aquele pesado bangalô.
A idéia de Mamoulian, assim como toda idéia brilhante, era
muito simples. Ele disse: “Vamos chamar algumas pessoas e
colocar rodas neste bangalô, e depois elas vão movê-lo para cá
e para lá sem problemas”. Assim feito, a câmera adquiriu o
movimento.
Nesta mesma época outras pessoas também tiveram idéias para
este mesmo fim. William Wyler colocou a câmera sobre trilhos
enquanto filmava um faroeste chamado Hell´s Heroes. Embora este
filme tenha sido feito um pouco depois de Applause, não existe
indicação que Wyler copiou sua idéia, pois um estava filmando
em Nova York e outro no oeste e, a comunicação entre as duas
costas não era tão rápida ou freqüente quanto é hoje.
No dia em que devolveu o movimento à câmera, Mamoulian disse
que chegou em casa exausto, cheio de dúvidas sobre o que havia
feito, e preocupado que tivesse sido seu último dia na
Paramount. Na manhã seguinte, ao chegar o estúdio, até o
porteiro já estava sabendo da revolução que havia sido feita.
Great Moguls, Adolph Zukor e Jesse Lasky, donos do estúdio, já
tinham visto as cenas filmadas e estavam empolgadíssimos. Eles
disseram: “Tudo que o que Mamoulian quiser, façam”.
Com a câmera se movimentando novamente, mesmo precisando de
seis homens como Arnold Schwarzenegger para empurrá-la,
Mamoulian sentiu confiança em atacar outro grande problema: as
limitações de possuir apenas um canal de som. Se em uma cena,
por exemplo, Helen Morgan canta um canção de ninar para sua
filha, enquanto esta sussura uma oração, nem na vida real, nem
no palco, seria possível ententeder o que menina fala. Foi
quando Mamoulian sugeriu: “Vamos gravar a oração em um canal
e a canção em outro, e vamos controlar os dois, de forma que
teremos dois canais de som”. Claro que funcionou, e depois
disto todos estavam usando som multi-canal.
Zukor e Lasky estavam caídos de admiração por Mamoulian
quando terminou seu filme. Eles fizeram discursos e mais
discursos sobre como Applause estava maravilhoso e pediram que
ele fosse descansar por duas semanas, para depois assinar o mais
maravilhoso contrato com a Paramount.
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O Aparecimento do
Som - Parte 7
Durante esta duas semanas,
Applause recebeu críticas fenomenais, mas arrecadou muito pouco
nas bilheterias. Não havia estrelas neste filme, e naquele
tempo, era isto que o publico queria acima de qualquer coisa.
Acabaram se passando doze meses e não duas semanas para Zukor
contatar Mamoulian novamente. Isto veio a mostrar que tanto
naquela época quanto hoje, o mérito artístico é importante,
mas o que vale mesmo é o quanto ele rende nas caixas
registradoras.
Mamoulian foi chamado então para dirigir City Streets,
estrelando Sylvia Sidney e Gary Cooper. Neste filme, que não
era particularmente bom, o diretor voltou a inovar. Pela
primeira vez foi possível “escutar os pensamentos” do ator
em foco. Todos diziam: “Cooper não está na cena, ela está
sozinha em seu quarto e é possível escutar a voz dele em seu
pensamento”.
Apesar de sua efetiva contribuição para o desenvolvimento dos
filmes falados, não foi Mamoulina quem fez o primeiro clássico
desta era. Esta honra coube a Lewis Milestone, o diretor de All
Quiet on the Western Front. A história, é lógico, mostrava
batalha de vida e morte nas trincheiras durante a Primeira
Guerra Mundial. Milestone não foi tão inventivo quanto
Mamoulian, mas assim como ele, se recusava a ser dominado ou
limitado pelos movimentos da câmera. Por este filme ele ganhou
o Oscar de melhor diretor em 1930.
1930 também foi o ano do primeiro filme falado de Greta Garbo,
Anne Christie, que foi largamente anunciado com o slogan:
“Garbo Fala!” Desde o aparecimento do som, Garbo havia feito
sete filmes, e todos mudos. Ela havia visto muitos de seus
antigos colegas encerrarem suas carreiras porque ou não falavam
bem ou suas vozes não eram o que o público esperava. Ela era a
grande estrela da MGM e possuía um sotaque muito acentuado. A
preocupação do estúdio era grande, inclusive porque para
continuar sua carreira de sucesso, ela deveria fazer a transição
para o som. A demora de mais três anos foi uma decisão sábia.
Em 1930 a qualidade do som havia melhorado muito em comparação
ao início, e o público acabou ficando encantado com a primeira
fala de Garbo no cinema:” Gimme a whisky with ginger ale on
the side and don´t be stingy, baby”. Um crítico descreveu
sua voz como rica, voluptuosa, límpida e sonora.
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O
Aparecimento do Som - Parte 8
Impulsionada pelo sucesso ameriano de Anne Christie, Garbo fez
logo em seguida a versão alemã e sueca deste filme. As práticas
que Hollywood exercia para garantir seu mercado internacional
eram basicamente duas: a primeira, patentear todos os sistemas
de som mais eficientes e, a segunda, fazer versões estrangeiras
de seus filmes. E eram versões integrais, pois os atores não
eram dublados, nem usava-se legenda.
Agora que Garbo havia finalmente entrado na era do som, não
havia mais dúvida que o filme falado tinha vindo para ficar,
mesmo embora Hollywood ainda não estivesse plenamente
satisfeita. Sylvia Sidney recorda que quando chegou de Nova
Yorque em 1929, todos diziam para ela: “Os anos dourados de
Hollywood acabaram. Agora nós temos uma Hollywood sem glamour
porque todos vocês vem da Broadway para fazer filmes.”
Financeiramente, a época dourada estava para começar, mas uma
outra havia chegado ao fim. Um efeito disto foi colocar um poder
inimaginável na mão dos grandes estúdios e seus escritórios
em Nova Yorque. Outro foi ter eclipsado muitos astros e estrelas
que estiveram entre os maiores do mundo. O ator alemão Emil
Jannings, que em 1927/28 havia ganhado dois Oscar de melhor ator
por sua participação em The Way of All Flesh e The Last
Command (ambos filmes mudos), estava entre estas personalidades.
Mas a mais famosa vítima foi John Gilbert. Ele era um dos
astros mais famosos do cinema mudo, o equivalente masculino de
Greta Garbo (com quem co-estrelou inúmeros filmes), e o som pôs
fim a sua carreira. Normalmente, o motivo alegado por sua queda
era a voz inadequada. Acredita-se, entretanto, que isto seja
parte da história. O problema mesmo eram as dores de cabeça
que sua presença provocava. Além de discussões constantes com
Louis B. Mayer, diretor do estúdio, o ele tinha problemas
graves com o álcool. Há quem afirme que Mayer odiava tanto
Gilbert que deliberadamente distorceu sua voz em His Glorious
Night (1929) que supostamente faria sua grande passagem para o
filme falado. Verdade ou não, o público achou sua voz engraçada
e muito mais suave do que eles esperavam.
O que torna a acusação contra Mayer mais verossímel é que em
seus filmes subseqüentes o ator mostrou ter uma voz bem mais
agradável, sem nenhuma comparação ao que foi mostrado em His
Glorious Night. Por outro lado, parece loucura que o diretor de
um estúdio quisesse destruir a carreira de seu astro mais
precioso e que tinha apenas 32 anos na época. O fato é que,
depois de mais um ou dois filmes falados, a MGM perdeu o
interesse por ele.
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Dogma 95: o manifesto cinematográfico
dinamarquês
Um grupo de diretores da
Dinamarca agitou o cinema europeu ao lançar o Dogma 95,
manifesto que defende um cinema baseado em 10 “mandamentos”,
que são conhecidos como Voto de Castidade:
1. A filmagem deve ser feita na própria locação, sem cenários
construídos
2. O som nunca deve ser produzido separado das imagens ou
vice-versa. Música não deve ser usada, a não ser que ocorra
no momento em que a cena estiver sendo filmada.
3. A câmera deve ser movimentada manualmente
4.O filme deve ser colorido, e qualquer efeito de luz é
proibido
5. Efeitos especias e filtros são proibidos
6. O filme não deve conter ação superfical como assassinatos,
explosões, etc
7. O filme deve estar bem definido no tempo e espaço
8. Filmes autorais são proibidos
9. O filme deve ser Academy 35 mm.
10. O diretor não deve ser creditado
“Mifune” e “Festa em Família”, que foi inclusive
indicado ao Oscar de filme estrangeiro, são alguns dos exemplos
desse dogmatismo dinamarquês. “Mifune” dirigido por Soren
Kragh-Jacobsen, conta a história de um rapaz que tem de voltar
à casa de seu pai, depois da morte deste. Lá reencontra seu
irmão, um deficiente mental. Para cuidar dele, contrata uma
bela mulher, por quem acaba se apaixonando. O título é uma
referência ao ator japonês Toshiro Mifune.
Para conhecer melhor o Dogma 95:
Site Oficial : http://www.dogme95.dk/
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