“Onde está você, Geração 80?" A pergunta é feita, 20 anos
depois, aos artistas que renovaram a arte brasileira na histórica
exposição Como vai você, Geração 80?, realizada em 1984, na
Escola de Artes Visuais do Parque Lage do Rio de Janeiro. A mostra
lançou artistas que hoje são marcantes na cena artística brasileira
e internacional como Daniel Senise, Beatriz Milhazes, Jorge Guinle
Filho, Leonilson, Leda Catunda e Victor Arruda. Agora, o curador
Marcus Lontra – idealizador da mostra original – propõe outra
indagação, reunindo 130 trabalhos de 48 artistas que participaram
daquela exposição histórica ou que têm a poética associada às
questões levantadas naquela época. O resultado está na mostra Onde
está você, Geração 80?, que abre as portas no próximo dia 23 de
novembro, no Centro Cultural Banco do Brasil, e pode ser vista até o
dia nove de janeiro de 2005.
Onde está você, Geração 80?
inclui não apenas os trabalhos marcantes dos anos 80, mas também
exemplos da produção atual dos artistas. Com isso, a exposição
pretende provocar uma reflexão sobre o impacto dos parâmetros
lançados em 1984 na arte brasileira e sua continuidade no panorama
atual. Nomes importantes que não estiveram na exposição original,
como o escultor Angelo Venosa, o pintor Alex Flemming e os integrantes
do grupo paulistano Casa 7 – Nuno Ramos, Carlito Carvalhosa, Fabio
Miguez, Paulo Monteiro e Rodrigo Andrade – também foram acrescidos
à mostra, por fazerem parte da mesma geração e compartilharem do
mesmo processo criativo. Onde está você, Geração 80? mostrará
para o público o vigor que estes artistas imprimiram na arte
brasileira.
– A importância desta exposição
se traduz no pioneirismo desta geração de artistas na busca pelo
acesso democrático à arte no Brasil – declarou Marcelo Mendonça,
diretor do Centro Cultural Banco do Brasil em Brasília.
A exposição é dividida em 13
segmentos que sistematizam as várias produções. Em A Preparação
estão os trabalhos que firmaram as bases estéticas da arte da
década de 80. Em Cena: A Figura mostra a afirmação de personagens e
ícones do mundo pop. Herói Romântico é o espaço reservado a
Leonilson, artista emblemático da década de 80. À Flor da Pele
apresenta a técnica comum aos artistas dos anos 80 de construir a
obra com camadas de cor. Em Engrenagens e Engenhos está a
assimilação do fazer rudimentar e a incorporação do humor como
instrumento de comunicação. O segmento Registros, Vestígios,
Sinais... exibe exemplos de trabalhos que apropriam signos da
comunicação urbana, acrescentando uma poética irônica ou erótica.
Arquiteturas da Cor apresenta trabalhos que reestruturam a herança
construtiva e geométrica, assimilando o lirismo; Matriz Popular tem
representações da fusão entre erudito e popular; Poética da
Paisagem mostra uma revisão da paisagem nos anos 80, com a
percepção do mundo através do olhar; Fantasias da Forma inclui
trabalhos baseados na poesia e na expressividade subjetiva; Aventuras
do Espaço contém obras nas quais o gesto conduz o olhar e constrói
o território de ação da arte; Oficina do Fazer apresenta a obra do
ateliê coletivo paulista chamado Casa 7, onde cinco artistas
trabalharam na década de 80; e Marcas da Paixão explora o corpo
humano como faceta visceral da arte.
Onde está você, Geração 80? vai
apresentar obras de Alex Flemming, Alex Vallauri, Ana Horta, Ana Maria
Tavares, Ana Miguel, Armando Mattos, Ângelo Venosa, Barrão, Beatriz
Milhazes, Carlito Carvalhosa, Chico Cunha, Ciro Cozzolino, Cláudio
Fonseca, Cristina Canale, Cristina Salgado, Daniel Senise, Delson
Uchoa, Enéas Valle, Fabio Miguez, Fernando Lopes, Fernando Lucchesi,
Frida Baranek, Gonçalo Ivo, Hilton Berredo, Isaura Pena, Jadir
Freire, João Magalhães, Jorge Duarte, Jorge Guinle, Karin Lambrecht,
Leda Catunda, Leonilson, Luiz Ernesto, Luiz Pizarro, Luiz Zerbini,
Marcus André, Mario Azevedo, Maurício Bentes, Mônica Sartori,
Mônica Nador, Nuno Ramos, Paulo Monteiro, Paulo Paes, Rodrigo
Andrade, Sergio Romagnolo, Sergio Niculitcheff, Suzana Queiroga e
Victor Arruda.
Um pouco de história
A década de 80 marcou a chamada
"volta à pintura" – que aconteceu também em países como
a Itália, com a transvanguarda, e na Alemanha, com o
neoexpressionismo. No Brasil, este movimento de retorno assumiu
nuances próprias e plurais, que se confundem com a abertura política
e o apagar das luzes dos anos de chumbo da ditadura militar.
Muito mais do que uma simples volta
à pintura, os artistas daquele período lançaram uma nova leitura
para a associação entre arte e vida, amadurecida nos anos 60 e 70.
Com a abertura democrática, sem a necessidade de falar nas
entrelinhas para burlar a censura, estes artistas deixam de citar os
grandes temas políticos. Eles assumem o papel de cronistas do
cotidiano, tratando de temas como a sexualidade e a vida urbana.
Elementos da cultura de massa, como heróis das histórias em
quadrinhos, personagens da TV e rótulos de refrigerante, invadem a
tela com a mesma força das citações à história da arte. A pintura
se transforma na mídia mais adequada para uma arte que procura ser
menos cerebral e recuperar o prazer pelo fazer. As enormes quantidades
de tinta formam camadas de matéria sobre a superfície do quadro. O
corpo passa a ser o elemento mais valorizado, tanto na construção da
figura, como na própria ação do gesto. Para conter esse gesto
amplo, corporal, são necessárias telas de formatos monumentais,
outra característica da arte do período.
Marcus Lontra ressalta o contexto
histórico-político existente em 1984. "Frederico de Morais, um
crítico que estimulou muito os artistas dos anos 80, tinha um texto
sobre os anos 70 intitulado 'A geração que levou porrada'. Tempos
depois, fiz um artigo sobre os anos 80 em que dizia que aquela era a
geração que não tinha levado porrada", lembra o curador. Para
ele, o momento das "Diretas Já" foi um pano de fundo
importante para a produção do período. "Havia uma sensação
interna de vitória, e as pessoas participavam da democratização
brasileira de uma maneira romantizada. Queríamos festejar, aproveitar
a vida". A liberação do corpo e a maior liberdade afetiva se
refletiram na estética da época. “A obra passa a ser um
espetáculo plástico. Os quadros são impactantes, um frenesi”,
complementa.
Outra questão marcante da geração
80 foi a mistura entre elementos da cultura popular e erudita, que
passam a ser citados à exaustão nos trabalhos destes artistas.
"Objetos do cotidiano são valorizados e ganham força
equivalente a signos da história da arte. Uma renda do nordeste
poderia ser tão importante quanto a imagem de uma pintura clássica.
Não há mais necessidade de se relacionar com a arte de forma
reverencial", observa Lontra. “A dramatização e o resgate da
emoção são outras questões devidas ao período", acrescenta
ele.
O curador ressalta ainda que
"esses artistas trouxeram para a arte a praxis como fundamento da
expressão artística. Daí a volta à pintura. Não se queria apenas
pensar o mundo, mas fazê-lo". Lontra prefere não usar o termo
"movimento" para definir aquele momento artístico. "A
Geração 80 não era um movimento no sentido teórico, mas de
conquista de espaço institucional. Era, antes de tudo, uma
engrenagem", afirma. "A idéia de que as pessoas tenham
acesso às artes e de que a ação artística não seja excludente é
válida até hoje. A geração 80 trouxe isso".
SERVIÇO:
Local: Galerias I e II do
Centro Cultural Banco do Brasil / DF
Visitação: de 23 de
novembro a 09 de janeiro de 2005
Horário:
de terça a domingo,
das 10h00 às 21h00
Informações:
310. 7087
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